BR-251: A RODOVIA DAS TRAGÉDIAS ANUNCIADAS

Um retrato cruel do abandono “Montes Claros é o segundo maior entroncamento rodoviário do país”, dizia o levantamento do DNIT na época. A BR-251, mesmo reconhecida como uma das mais perigosas de Minas, segue sem investimentos estruturais reais.

Mais uma década se passou — e o Norte de Minas continua contando mortos na estrada do descaso

Por Aurélio Vidal

Vidas ceifadas. Sonhos interrompidos. Famílias destruídas em um pequeno trecho do Brasil que deveria representar esperança — mas tornou-se sinônimo de luto e indignação.

Nos últimos meses, a BR-251, que corta o Norte de Minas, voltou a estampar manchetes pelos piores motivos.
No dia 19 de outubro de 2025, um grave acidente entre um carro e uma carreta deixou quatro pessoas da mesma família feridas, em Francisco Sá. Poucos dias antes, outra colisão entre três veículos — dois carros e uma carreta — interditou o km 463, também em Francisco Sá. E, em maio deste ano, o país se chocou novamente com a notícia de nove mortos após um caminhão bater em uma van que seguia de Uberlândia (MG) para o Ceará.A BR-251, palco dessas tragédias recentes, registra um acidente a cada dois dias. O que mais impressiona é que a história se repete, exatamente como há mais de uma década. Em 2013, quando um micro-ônibus de Rubelita seguia para Montes Claros levando pacientes para tratamento médico, 14 pessoas morreram e 11 ficaram feridas. Eu mesmo escrevi, naquele ano, um artigo alertando para o descaso, o abandono e a urgência de duplicar essa rodovia.
Passaram-se 11 anos — e nada mudou.

O CICLO DA TRAGÉDIA

“Montes Claros é o segundo maior entroncamento rodoviário do país”, dizia o levantamento do DNIT na época. A BR-251, mesmo reconhecida como uma das mais perigosas de Minas, segue sem investimentos estruturais reais. Hoje, o órgão admite que mais de 40% da via permanece em más condições. Buracos, pista estreita, ausência de acostamentos e sinalização precária formam o retrato cruel do abandono.

E não é apenas um número frio em planilha. São pais, mães e filhos que perdem a vida num asfalto que deveria levá-los de volta para casa.
São caminhoneiros que cruzam o sertão com medo.
São mecânicos, socorristas e bombeiros que já perderam a conta de quantos corpos tiveram de resgatar.

O ciclo da tragédia

A chamada “Serra de Francisco Sá”, entre os quilômetros 470 e 480, continua sendo o trecho mais temido. Curvas fechadas, declives perigosos e tráfego intenso de carretas transformam o local em um corredor de riscos.
Mesmo após anos de promessas, nenhuma medida efetiva foi tomada. O resultado é um ciclo de tragédias que se repete com a precisão de um relógio macabro.

A gente já anda com medo. Tem curva que parece chamar o acidente”, relata Antoniel Santana, motorista profissional de Taiobeiras, que percorre a BR-251 há mais de 26 anos.
Outro trabalhador da estrada, Ronaldo Moura, mecânico em Vale das Cancelas, confirma o que todos sabem: “Aqui, o perigo é constante. O acostamento é estreito, o caminhão passa rente, e ninguém faz nada.

PROMESSAS QUE SE PERDEM NA CURVA

Desde 2014, governos vêm prometendo duplicar a BR-251. Projetos foram anunciados, licitações abertas, estudos técnicos divulgados. Mas, como sempre, as promessas se perdem na curva da Serra, junto com as esperanças de quem depende dessa estrada para viver.

A população de cidades como Salinas, Francisco Sá, Grão Mogol e Padre Carvalho está cansada de cobrar providências. Manifestações, audiências públicas e notas oficiais já foram feitas, mas o que se vê, ano após ano, é a mesma política de maquiagem: tapam buracos, pintam faixas, tiram fotos e renovam promessas em época de eleição.

ENQUANTO ISSO, O SANGUE CONTINUA A MANCHAR O ASFALTO.

Mais uma década se passou — e o Norte de Minas continua contando mortos na estrada do descaso Foi numa manhã de segunda-feira, 25 de novembro de 2013, que o Norte de Minas parou diante de uma das maiores tragédias já registradas na BR-251.
Um micro-ônibus da Saúde de Rubelita, que transportava pacientes para tratamento em Montes Claros, colidiu com uma carreta e 14 vidas foram ceifadas naquele trecho de asfalto que já era conhecido pelo perigo.

RODOVIA DO MEDO E DA REVOLTA

O tráfego na BR-251 cresce a cada ano. Segundo estimativas recentes, cerca de 12 mil veículos passam diariamente pela rodovia, incluindo carretas pesadas que cortam o país de leste a oeste. A sobrecarga é imensa.
Mas o investimento, quase nulo.

Até quando o governo vai fingir que não enxerga?
Até quando o Brasil vai aceitar que o progresso continue sendo medido em corpos estendidos na pista?
O DNIT já reconhece a BR-251 como uma das rodovias mais perigosas de Minas Gerais, mas, mesmo assim, ela segue sem investimentos estruturais reais — apenas com paliativos e uma enxurrada de radares.
O Governo Federal é rápido para arrecadar, mas lento — quase parado — quando se trata de garantir segurança e salvar vidas.

É revoltante ver que, em pleno 2025, com toda a tecnologia e recursos arrecadados pelos impostos e pedágios, a vida humana ainda valha tão pouco diante da burocracia e da omissão do Estado.

DUPLICAÇÃO: PROMESSA QUE VIROU MIRAGEM

Os especialistas são unânimes: a duplicação da BR-251 é a única saída possível.
Não há mais espaço para paliativos. A estrada não comporta o fluxo, nem garante segurança mínima.
O que falta, na verdade, é vontade política e respeito pelas vidas perdidas.

Enquanto a duplicação segue como miragem e o poder público se cala, a cada semana novas cruzes são fincadas à beira do asfalto — símbolos silenciosos de uma tragédia anunciada.

O GRITO QUE ECOA DO SERTÃO

Mas, como sempre, as promessas se perdem na curva da Serra, junto com as esperanças de quem depende dessa estrada para viver.

Como jornalista e cidadão, não consigo silenciar diante de tanta indiferença.
É doloroso escrever, ano após ano, sobre as mesmas mortes, nos mesmos trechos, com as mesmas desculpas oficiais.
A BR-251 é o retrato fiel do que o Brasil insiste em não resolver: a distância entre o discurso e a ação, entre a promessa e a vida real.

O Norte de Minas clama por justiça, por investimento, por respeito.
Não queremos mais estatísticas. Queremos asfalto seguro, estrada duplicada e vidas preservadas.

Até quando o governo vai fingir que não enxerga?
Até quando o Brasil vai aceitar que o progresso continue sendo medido em corpos estendidos na pista?

Veja Mais

Artigos Relacionados:

Centro de Grão Mogol, com a igreja e a praça da cidade.

Grão Mogol: a cidade das pedras e das águas encanta com sua história e belezas naturais

Localizada na parte mais alta da Serra Geral, no Norte de Minas Gerais, Grão Mogol é um destino que transborda belezas naturais, biodiversidade e uma rica herança ligada aos diamantes e ao período colonial dos séculos XVI e XIX. A história pulsante dessa cidade pode ser encontrada nas ruas e vielas, cuja pavimentação foi erguida com a mão de obra dos escravizados. Nas trilhas e

Aqui no sertão, vejo pequenos agricultores sendo tratados como vilões, enquanto grandes empreendimentos seguem livres, leves e soltos. Vejo geraizeiros, vazanteiros, ribeirinhos e quilombolas encurralados por regras forjadas longe daqui, sem diálogo, sem compreensão, sem respeito pelas tradições que mantiveram essas terras vivas por séculos.

O FIASCO DA COP 30: A CONTRADIÇÃO QUE CHEGA AO SERTÃO NORTE-MINEIRO

Por Aurélio Vidal Não pisei nos corredores polidos da COP 30. Não acompanhei de perto os discursos inflamados, nem os tapetes sustentáveis feitos para impressionar delegações estrangeiras. Acompanhei tudo daqui, do meu lugar de fala: o sertão norte-mineiro, onde a natureza é vida real e não vitrine internacional. E foi justamente observando de longe, mas com o olhar treinado por anos de estrada e reportagem,

Seria um sonho se esse dinheiro fosse realmente aplicado no fomento do esporte, na valorização dos atletas, nas escolinhas de base, nos campeonatos de bairro, nas reformas das quadras e campos abandonados. Seria maravilhoso! Mas todos nós sabemos que não é assim que funciona. O roteiro é velho, o filme é repetido e o final é sempre o mesmo: os recursos são remanejados. E, mais uma vez, o esporte fica com as sobras, com a promessa e com o discurso bonito de sempre.

ORÇAMENTO BILIONÁRIO, ESPORTE ESQUECIDO

Por Aurélio Vidal Sinceramente, é revoltante! O orçamento solicitado para a pasta do Esporte em 2026 subiu nada menos que 150%. Isso mesmo! Pulou de pouco mais de R$ 20 milhões para absurdos R$ 55.316.136,62. Eu me pergunto: o que será que está nessa planilha que justifique tamanha cifra? Seria um sonho se esse dinheiro fosse realmente aplicado no fomento do esporte, na valorização dos

Estive diversas vezes no Vale do Jequitinhonha, inclusive visitando a planta de extração da Sigma Lithium, em Itinga, e também a Chapada do Lagoão, onde conversei com moradores, pequenos produtores e lideranças locais. Vi de perto a realidade de um povo que sempre lutou contra o abandono e a falta de oportunidades — e que agora começa a enxergar uma chance real de desenvolvimento, sem depender de assistencialismos ou discursos populistas.

O VALE E A VERDADE — UM RELATO DE QUEM FOI VER DE PERTO

Por Aurélio Vidal – jornalista Tenho acompanhado, com preocupação, a forma como alguns discursos ideológicos têm tentado distorcer a realidade do Vale do Jequitinhonha, especialmente no que diz respeito à exploração do lítio. Recentemente, a deputada federal Célia Xacriabá publicou uma nota alarmista em seu perfil do Instagram, onde afirma que Minas Gerais está sendo “devastada” pela mineração no Vale, citando a empresa Sigma Lithium

No final da tarde desta segunda-feira, 10 de novembro, tive a oportunidade de acompanhar uma apresentação bastante interessante no auditório do CIAMAMS, em Montes Claros. O evento, embora sem grande divulgação prévia, atraiu a presença de diversos prefeitos, secretários de Educação e autoridades políticas da região Norte-mineira. O tema central foi a demonstração da PenBoard, que trouxe uma solução tecnológica inovadora desenvolvida pela empresa PenBoard Soluções Educacionais Ltda, de Florianópolis (SC), que promete transformar a forma como ensinamos, aprendemos e apresentamos conteúdos.

PENBOARD – TECNOLOGIA E EDUCAÇÃO: UMA REVOLUÇÃO DIGITAL CHEGA ÀS SALAS DE AULA DO NORTE DE MINAS

Por Aurélio Vidal – Jornalista e Pesquisador Regional No final da tarde desta segunda-feira, 10 de novembro, tive a oportunidade de acompanhar uma apresentação bastante interessante no auditório do CIAMAMS, em Montes Claros. O evento, embora sem grande divulgação prévia, atraiu a presença de diversos prefeitos, secretários de Educação e autoridades políticas da região Norte-mineira. O tema central foi a demonstração da PenBoard, que trouxe

Centro de Grão Mogol, com a igreja e a praça da cidade.

Grão Mogol: a cidade das pedras e das águas encanta com sua história e belezas naturais

Localizada na parte mais alta da Serra Geral, no Norte de Minas Gerais, Grão Mogol é um destino que transborda belezas naturais, biodiversidade e uma rica herança ligada aos diamantes e ao período colonial dos séculos XVI e XIX. A história pulsante dessa cidade pode ser encontrada nas ruas e vielas, cuja pavimentação foi erguida com a mão de obra dos escravizados. Nas trilhas e

Aqui no sertão, vejo pequenos agricultores sendo tratados como vilões, enquanto grandes empreendimentos seguem livres, leves e soltos. Vejo geraizeiros, vazanteiros, ribeirinhos e quilombolas encurralados por regras forjadas longe daqui, sem diálogo, sem compreensão, sem respeito pelas tradições que mantiveram essas terras vivas por séculos.

O FIASCO DA COP 30: A CONTRADIÇÃO QUE CHEGA AO SERTÃO NORTE-MINEIRO

Por Aurélio Vidal Não pisei nos corredores polidos da COP 30. Não acompanhei de perto os discursos inflamados, nem os tapetes sustentáveis feitos para impressionar delegações estrangeiras. Acompanhei tudo daqui, do meu lugar de fala: o sertão norte-mineiro, onde a natureza é vida real e não vitrine internacional. E foi justamente observando de longe, mas com o olhar treinado por anos de estrada e reportagem,

Seria um sonho se esse dinheiro fosse realmente aplicado no fomento do esporte, na valorização dos atletas, nas escolinhas de base, nos campeonatos de bairro, nas reformas das quadras e campos abandonados. Seria maravilhoso! Mas todos nós sabemos que não é assim que funciona. O roteiro é velho, o filme é repetido e o final é sempre o mesmo: os recursos são remanejados. E, mais uma vez, o esporte fica com as sobras, com a promessa e com o discurso bonito de sempre.

ORÇAMENTO BILIONÁRIO, ESPORTE ESQUECIDO

Por Aurélio Vidal Sinceramente, é revoltante! O orçamento solicitado para a pasta do Esporte em 2026 subiu nada menos que 150%. Isso mesmo! Pulou de pouco mais de R$ 20 milhões para absurdos R$ 55.316.136,62. Eu me pergunto: o que será que está nessa planilha que justifique tamanha cifra? Seria um sonho se esse dinheiro fosse realmente aplicado no fomento do esporte, na valorização dos

Estive diversas vezes no Vale do Jequitinhonha, inclusive visitando a planta de extração da Sigma Lithium, em Itinga, e também a Chapada do Lagoão, onde conversei com moradores, pequenos produtores e lideranças locais. Vi de perto a realidade de um povo que sempre lutou contra o abandono e a falta de oportunidades — e que agora começa a enxergar uma chance real de desenvolvimento, sem depender de assistencialismos ou discursos populistas.

O VALE E A VERDADE — UM RELATO DE QUEM FOI VER DE PERTO

Por Aurélio Vidal – jornalista Tenho acompanhado, com preocupação, a forma como alguns discursos ideológicos têm tentado distorcer a realidade do Vale do Jequitinhonha, especialmente no que diz respeito à exploração do lítio. Recentemente, a deputada federal Célia Xacriabá publicou uma nota alarmista em seu perfil do Instagram, onde afirma que Minas Gerais está sendo “devastada” pela mineração no Vale, citando a empresa Sigma Lithium

No final da tarde desta segunda-feira, 10 de novembro, tive a oportunidade de acompanhar uma apresentação bastante interessante no auditório do CIAMAMS, em Montes Claros. O evento, embora sem grande divulgação prévia, atraiu a presença de diversos prefeitos, secretários de Educação e autoridades políticas da região Norte-mineira. O tema central foi a demonstração da PenBoard, que trouxe uma solução tecnológica inovadora desenvolvida pela empresa PenBoard Soluções Educacionais Ltda, de Florianópolis (SC), que promete transformar a forma como ensinamos, aprendemos e apresentamos conteúdos.

PENBOARD – TECNOLOGIA E EDUCAÇÃO: UMA REVOLUÇÃO DIGITAL CHEGA ÀS SALAS DE AULA DO NORTE DE MINAS

Por Aurélio Vidal – Jornalista e Pesquisador Regional No final da tarde desta segunda-feira, 10 de novembro, tive a oportunidade de acompanhar uma apresentação bastante interessante no auditório do CIAMAMS, em Montes Claros. O evento, embora sem grande divulgação prévia, atraiu a presença de diversos prefeitos, secretários de Educação e autoridades políticas da região Norte-mineira. O tema central foi a demonstração da PenBoard, que trouxe

Quer ver mais conteúdos?

Assine Nossa Newsletter

E fique por dentro do contexto de Minas e de tudo que acontece no Brasil e no mundo.

Pod Sertão Pautando o melhor do Sertão Mineiro

Olá, visitante