Um dos pilares da economia de São João do Paraíso, no extremo norte de Minas Gerais, tem raízes antigas e doces. Literalmente doces. É o cultivo do marmeleiro (Cydonia oblonga), planta originária da Ásia Menor e do Sudeste da Europa, que há séculos encanta paladares e sustenta famílias inteiras. Conhecido também como Pereira-do-Japão ou Marmeleiro-da-Europa, o fruto dessa árvore, o marmelo, deu origem a um dos produtos mais tradicionais da culinária mineira: a marmelada.
Segundo registros históricos, o marmeleiro foi introduzido no Brasil em 1530, pelo português Martim Afonso de Souza, e se adaptou muito bem ao clima e ao solo das montanhas paulistas. De lá, a cultura se espalhou pela Serra da Mantiqueira, principalmente nos municípios de Delfim Moreira e Marmelópolis, que chegaram a abrigar, no século XX, as maiores plantações e fábricas de marmelada do país — entre elas, a famosa Cica, em Delfim Moreira.
Com o tempo, porém, a produção entrou em declínio, sobretudo a partir da década de 1970, quando a cultura do marmeleiro perdeu espaço para outras lavouras. Hoje, Marmelópolis ainda preserva a tradição com uma única fábrica em funcionamento, mas o título simbólico de “Capital do Doce de Marmelo” mudou de endereço: pertence agora à terra quente e acolhedora de São João do Paraíso, que respira marmelo o ano inteiro.
De acordo com os dados mais recentes do IBGE (Produção Agrícola Municipal – PAM), São João do Paraíso é o maior produtor de doce de marmelo de Minas Gerais, à frente de cidades tradicionais como Marmelópolis, Itacambira, Novo Cruzeiro, Serro, Cachoeira do Pajeú e Delfim Moreira. No município, a cadeia do marmelo movimenta a economia e garante sustento a cerca de 70 famílias, envolvidas no cultivo, na colheita e na fabricação artesanal do doce.
O doce de marmelo paraisense é considerado um produto nobre. Feito de forma quase artesanal, sem conservantes e com frutas cuidadosamente selecionadas, mantém o sabor natural e autêntico que conquista quem prova. Os doces são comercializados embalados a vácuo ou em palhas de bananeira, método tradicional que preserva o sabor por mais tempo.
Nos últimos anos, alguns produtores passaram a investir em embalagens personalizadas e na criação de marcas próprias, agregando valor e identidade ao produto. Ainda assim, a principal marca é a da origem: “Doce de Marmelo de São João do Paraíso”, reconhecida como sinônimo de qualidade — assim como ocorre com as nobres cachaças artesanais de Salinas, outro orgulho do norte mineiro.
O sucesso do produto levou à criação da Cooperativa dos Produtores de Marmelo de São João do Paraíso (Coopemar), que reúne produtores locais com o objetivo de fortalecer a cadeia produtiva, melhorar o rendimento e aperfeiçoar ainda mais a qualidade do doce. A organização e o espírito cooperativo consolidaram o município como referência nacional na produção da iguaria.
Dona Dina, uma sertaneja de fibra e exemplo de empreendedorismo rural
Durante uma das minas visitas à cidade, tive a oportunidade de conhecer alguns desses produtores, entre eles Dona Dina, uma sertaneja de fibra e exemplo de empreendedorismo rural. Em sua pequena propriedade, logo na entrada da cidade, ela mantém uma plantação de marmeleiro e uma fábrica artesanal montada com recursos próprios. Com dedicação e talento, Dona Dina transformou o que era uma tradição familiar em fonte de renda e orgulho regional.
Assim, entre o aroma adocicado dos tachos e o trabalho das mãos calejadas de quem vive da terra, São João do Paraíso reafirma seu título com sabor e identidade:
é, com justiça, a Capital Mineira do Doce de Marmelo.




