Por Aurélio Vidal – Jornalista
Sou daqueles que ainda acreditam na força das manhãs simples. É nos Mercados Municipais que descubro, vez após vez, a poesia mais genuína da vida. Ali, onde o tempo caminha descalço e os laços se tecem no calor dos olhos, cada canto guarda um fragmento da nossa alma sertaneja.
É nesse espaço de chão batido e histórias vivas que a essência do nosso povo se revela por inteiro. Foi numa das minhas idas ao mercado de Rio Pardo de Minas que conheci o Seu Preto — artesão do cerrado, mestre da simplicidade. Suas vassouras e peneiras não saem de fábrica; brotam do mato, da palha do coqueiro, do que o sertão dá com generosidade. Cristão devoto e homem da roça, Seu Preto fala com orgulho da sua rocinha de café e dos cultivos que cuida com as próprias mãos. Sua voz tem o som da palha seca ao vento — firme, serena, sincera.
Entre os corredores também se encontra Seu Eurico Viana, um dos caçulas do mercado, apesar dos 80 anos de idade. Morador da fazenda Sobrado, há sete anos dedica seus dias à venda de arreios. Não por necessidade, mas por amor à rotina e pelo desejo de manter viva a tradição. O banco onde expõe seus produtos é também um banco de memórias.
E como não falar de Dona Santa Ferreira, mulher de riso fácil e alma ativa. Aos 82 anos, continua presente, dia após dia, escrevendo sua história naquele mercado que conhece como a palma da mão. Há mais de meio século, viu o mercado velho ser desmontado e o novo tomar forma. Mas, para ela, o espírito do lugar jamais mudou.
Dona Bela,74 anos, da comunidade de Água Boa II, também é figura marcante. Conhecida não só por suas hortaliças frescas e feijão verde orvalhado, mas por resistir, com coragem, à opressão do ICMBio. Acorda antes do dia nascer e, ainda no escuro, prepara os temperos, os maços de cheiro-verde, os pacotinhos de saber antigo. Tive a honra de acompanhar sua lida, que começa na tarde anterior e só termina quando tudo está pronto para a jornada até o mercado.
Mas o mercado não é feito só deles. É feito de muitos. De homens e mulheres que acordam antes do sol, que só descansam quando tudo se ajeita. É o feirante que corta o queijo na medida certa, a senhora que vende bolos como quem oferece afeto, o menino que ajuda a mãe na banca e aprende cedo o valor do suor.
É nesse espaço que a vida sertaneja pulsa com força. No cheiro do café coado, nas conversas temperadas de riso, nos reencontros que surgem ao acaso. O mercado é mais que comércio. É altar do povo, trincheira de sobrevivência, santuário da esperança. É patrimônio afetivo de uma gente que resiste.
Como jornalista e filho dessa terra, me reconheço nessa paisagem. Ao atravessar os corredores do mercado, não sou apenas um observador — sou memória em carne viva. O mercado me ensina, me reconecta, me fortalece. Porque é ali que entendo, com toda a clareza, que a dignidade do povo começa na terra, floresce na feira e brilha nos rostos anônimos que fazem desse lugar um símbolo de resistência e fé.